quarta-feira, 11 de julho de 2007

Cenas de vida 11- O fim do mito alentejano

Entro em Portugal pela fronteira de Elvas, ansioso por comer um “petisco” alentejano e matar saudades da comida portuguesa que não trinco há duas semanas. Abandono a auto-estrada e vou em busca de um local onde possa saciar o meu desejo. Ao fim de alguns quilómetros ( que se hão-de estender até às proximidades de Évora) constato que perdi tempo à procura de algo que já não existe...

O mito alentejano que surgiu algures nos anos 70 e se acentuou na década de 80 está a esfumar-se.Os vinhos já não são o que eram e a hotelaria de qualidade é uma coisa que praticamente não existe, porque não chega ter boas instalações, é preciso também ter bom serviço e os restaurantes apostarem numa boa comida regional, em detrimento da comida internacional asséptica a que alguns “gourmets” encartados chamam de “fusão”. Mas, como me disse um hoteleiro, o problema é que nas Escolas de Hotelaria é isso que ensinam!
E quanto a pessoal? Os locais não querem trabalhar na hotelaria e quem troca uma quitanda em Lisboa ou no Porto, com comensais diários assegurados, por um estabelecimento hoteleiro , ainda que luxuoso, mas quase sempre às moscas?
Quem entra em Portugal pela fronteira do Caia e pensa poder matar saudades da cozinha portuguesa, desiluda-se. Desapareceram as velhas casas de pasto e tasquinhas onde a comida regional alentejana era quase sempre boa e proliferam as marisqueiras, muito procuradas pelos espanhóis, principalmente ao fim de semana .
A cultura cerealífera, que emprestava toda aquela “mística” à paisagem alentejana deu lugar a pastos para porco preto, borregos e pouco mais, e os olivais reduzem-se a pequenos tufos verdes, circundando os “montes” com piscinas, que muitos lisboetas compraram para repouso de fim de semana.
Também muitos europeus vieram instalar-se no Alentejo, em busca do sossego que já não encontram nos seus países, optando por uma vida em contacto permanente com a natureza. Passeando pelo Alentejo, constata-se que não foi só a paisagem a mudar radicalmente com o Alqueva, para gáudio de espanhóis e amantes de desportos aquáticos. Mudou também a própria essência da região
Quanto à costa alentejana, estamos conversados. De PIN ( Projecto de Interesse Nacional) em PIN, vão desaparecendo as praias de excelência e surgindo os empreendimentos turísticos cavalgando a costa.
Por muito que a Odete Santos insista em dizer o contrário, a verdade é que o Alentejo nunca mais voltará a ser “nosso” ( nem “deles”...)