quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Avivem-me a memória, por favor!

Notícia do "Público"

Rave contratou ex-director da Refer que recebeu indemnização de 210 mil euros
O antigo director-geral de exploração da Rede Ferroviária Nacional (Refer) saiu em Junho de 2006 da empresa com uma indemnização de 210 mil euros e três meses depois foi contratado, como assessor, pela Rave, uma empresa do mesmo grupo responsável pelo desenvolvimento do comboio de alta velocidade, avança hoje o "Correio da Manhã".
Manuel Lopes Marques, ex-director-geral de exploração e conservação da Refer — empresa presidida por Luís Pardal —, saiu a seu pedido em Junho de 2006, recebendo uma indemnização correspondente aos 35 anos de trabalho na empresa pública. A situação foi confirmada ao jornal por Rui Reis, porta-voz da Refer.No último trimestre do ano passado, Manuel Lopes Marques foi contratado para assessor do conselho de administração da Rave (Rede Ferroviária de Alta Velocidade), que é presidida também por Luís Pardal, com um vencimento mensal de 5050 euros.Rui Reis considerou normal a transferência, referindo que Manuel Lopes Marques era o único técnico exterior à Rave que poderia dar uma assessoria técnica no projecto do TGV.O jornal acrescenta ainda que no último trimestre do ano passado vários consultores deixaram o projecto do comboio de alta velocidade, pelo que houve necessidade de criar uma assessoria técnica.A Rave registou um resultado negativo de 22 mil euros em 2005 (último ano de que existem dados), enquanto a Refer fechou o ano passado com prejuízos acima de 160 milhões de euros.


Como é que se chama a isto? Por favor, avivem-me a memória que eu já me esqueci!

RTP 1-Cinzenta

Estranhamente ( por se tratar de um canal de serviço público) a RTP1 parece não estar muito preocupada com os problemas ambientais. Nunca conseguiu ter um programa sobre o assunto em horário nobre e descartou as suas iniciativas ambientais fim de poucos meses. Um exemplo recente,que ilustra bem a indiferença do canal Público de televisão face aos problemas ambientais, é o "Planeta Azul" do Pedro Oliveira que ia para o ar ao domingo de manhã ( quando não havia Fórmula 1) . Ao que julgo saber, o argumento para acabar com o programa foi o mesmo usado com a "Loja do Consumidor", emitido ao sábado, às 11 horas da manhã, "quando calhava": fracas audiências! A ser verdade - creio que é, mas só parcialmente...- vale a pena desmontar a argumentação. Como é que um programa sobre defesa do consumidor pode ter grande audiência às 11 da manhã, se os seus destinatários andam às compras a essa hora? Lembro, a propósito, que o programa sobre consumo de maior sucesso em Itália, está no ar, semanalmente, entre as 20 e as 22 horas. Quanto ao "Planeta Azul", programa de grande qualidade, creio que uma das razões que o levou ao extertor foi a sua intermitência ( constantemente subalternizado face às transmissões da Fórmula1). Claro que em um e outro caso houve razões de outra dimensão para sairem da "grelha", que não caberá aqui escalpelizar...
No ano em que comemora o seu cinquentenário, com uma melhoria na programação e acentuada subida das audiências, a RTP teria a obrigação de dar a todos os portugueses um programa sobre ambiente em horário nobre. É minha absoluta convicção que, sendo bem feito, teria audiências surpreendentes. Os portugueses estão neste momento muito sensibilizados para o problema e começam a querer saber o que devem fazer para evitar males maiores. Sem pretender ser catastrofista, lembro apenas que as estimativas feitas no início dos anos 90 por um grupo de 140 cientistas ( entre os quais se encontravam vários Prémios Nobel) em relação à escassez de água, alterações climáticas e desertificação, se revelam hoje muito optimistas. Na verdade, não só os efeitos das alterações climáticas serão mais devastadores do que o então esperado, como também o aceleramento da desertificação e da escassez de água são uma realidade incontornável. Perante isto pergunto: até quando é que a RTP continuará a fazer como a avestruz, cingindo as suas preocupações informativas sobre o ambiente a um programa de meia dúzia de minutos (produzido por uma empresa de reciclagem!) remetido para meio da tarde na RTP2? Até quando é que Portugal será o único país europeu em que a televisão pública não tem um programa de referência sobre ambiente?

O "EXPRESSO " Verde

O "Expresso" decidiu dedicar o mês de Fevereiro ao ambiente. Trata-se de uma iniciativa inédita na comunicação social portuguesa que se saúda, mas peca por tardia e parece vir a reboque do inesperado sucesso do filme de Al Gore "Uma Verdade Inconveniente" ( que recentemente veio a Portugal fazer uma conferência de 50 minutos a troco de 175 mil dólares, pagos por um consórcio de empresas. Fica por saber a razão que impediu a comunicação social de estar presente, mas tenho a impressão que sei a resposta...) .
As duas edições do "Expresso" já publicadas merecem um balanço positivo, pese embora o facto de fazerem múltiplas alusões à necessidade de cumprir Quioto, quando hoje em dia o que está em questão é já a definição das metas a traçar pós Quioto ( a partir de 2012). Todos os cadernos e a Revista "Única" têm variados artigos sobre ambiente e existem muitas caixas com informação aos leitores de grande utilidade. Receio, no entanto, que esta"overdose" de temas sobre o ambiente se esgote no fim do mês e que depois tudo volte à estaca zero. Sei, por experiência própria de quem há 30 anos escreve sobre o assunto, a dificuldade que há em incluir temas sobre o ambiente nos jornais. Pessoalmente, posso dizer que apenas dois ( "O Público" e a "Tribuna de Macau") me franquearam as portas para escrever sobre o assunto livremente. Em relação à Tribuna, lembro o grande destaque que deu às reportagens que fiz durante a Cimeira do Rio em 92. Quanto ao "Público", é o jornal português que de forma mais sistemática aborda estas temáticas, embora nos últimos tempos se venha notando uma subalternização do tema em relação ao passado.
Receio que, em relação ao "Expresso", a abordagem da temática se esvazie no final do mês e, se assim for, perder-se-á muito do efeito que o jornal parece querer obter com a iniciativa. Sempre fui contra as "overdoses" informativas, muito frequentes a propósito dos "Dias Internacionais". No dia Internacional do Deficiente, por exemplo, todos os media fazem reportagens e dão informação abundante sobre o assunto, mas ao longo do ano raras vezes escrevem ou falam sobre a deficiência e as temáticas colaterais, como as barreiras urbanísticas- para citar apenas um exemplo.
Os problemas ambientais são demasiado sérios e têm que estar permanentemente na ordem do dia. Só devidamente informados, os cidadãos tomarão consciência das consequências das alterações climáticas e se sensibilizarão para a necessidade de alterar os seus hábitos quotidianos. O filme de Al Gore - e as sucessivas conferências que vem dando por todo o mundo- contribuiu para alertar muitas pessoas que até há pouco tempo encaravam o assunto como se se tratasse de ficção científica. Compete à comunicação social alimentar esta chama. Sem alarmismos nem catastrofismos, mas de uma forma ponderada que desperte em cada cidadão do mundo uma consciência cívica em prol da defesa do Planeta.

Bye. Vou a banhos para aqui. Até daqui a uma semana.


quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Há 40 anos

Tim Buckley gravou em 1967 "Goodbye and Hello" um album lendário na história da música popular anglo-americana. O seu génio contrasta com algum deserto de criação que infesta hoje a indústria discográfica. A cerimónia recente dos Grammys foi bem a ilustração de velhos tiques, redundâncias e muita mediocridade. Alguém reteve um nome, uma canção, para além dos vestidos das coquettes?

Caldos de galinha

"Sem que isso possa significar uma intromissão nas competências de outros órgãos de soberania, espero que se procurem soluções de bom senso, equilibradas e ponderadas que possam ajudar a unir os portugueses", afirmou Cavaco Silva aos jornalistas, no final da sessão solene de abertura do novo ano lectivo do Colégio Universitário de Cooperação, em Lisboa.

Prudência e caldos de galinha nunca fizeram mal a ninguém. Numa matéria tão fracturante seria bom que se evitassem as precipitações e os leaks para a imprensa. Se a maioria PS viabiliza a lei, seja ela qual for, seria mau que se fosse mais longe que os pressupostos que se anunciaram para a lei. Até porque para os lados da extrema extrema da representação da esquerda já soam clamores de poder popular...

Estarei enganado?

"Correia de Campos deixou um recado claro aos deputados do seu partido: a reforma da saúde é um comboio, uma caravana em marcha. Os deputados são passageiros que representam os cidadãos. Não são revisores nem maquinistas , avisou. O maquinista quando muito, sou eu".
Ministro da Saúde citado no Público, a propósito da sua intervenção nas jornadas parlamentares do PS a decorrer em Óbidos
Lê-se e abre-se a boca de espanto! Então o sr. Ministro pensa que a atitude dos deputados -que como refere e bem representam os cidadãos - deve ser uma atitude contemplativa e passiva, idêntica à dos passageiros que viajam num comboio e se limitam a ver a paisagem e dormir nos intervalos? Se assim é, para que raio é que os portugueses são chamados a votar regularmente?Para docilidade já chega a do povo português ( curiosamente mencionada pelo Ministro Manuel Pinho durante a viagem à China). Aos deputados, exige-se que representem os interesses dos cidadãos, intervindo sempre que necessário, para corrigir os erros que o Governo, cada vez mais distante da população, vai amiúde cometendo. Ou estarei enganado?

Deixem-se de peras postiças...

Diz Rui Ramos no Público:
(...) Em Identificação de Um País (1986), José Mattoso explicou como esta pluralidade estava inscrita no código genético de Portugal. Pouca gente, pelos vistos, percebeu a lição. O que a modernidade fez em Portugal foi dar dimensão política a velhas fronteiras culturais. É significativo que, tendo a sociedade portuguesa mudado tanto nos últimos quarenta anos, essas fronteiras tenham permanecido, independentemente das velhas civilizações rurais com que andaram associadas. Aqueles que aspiraram a governar Portugal longamente e mais ou menos em sossego souberam sempre que, além do país que estava com eles, havia outro país que precisavam de ter em conta. Até os republicanos, no fim, procuraram corrigir o seu terrorismo laicista, com António José de Almeida a impor o barrete cardinalício ao núncio papal. E Salazar, ao contrário do general Franco, nunca restaurou a monarquia e o catolicismo como religião de Estado.
Este país e o seu futuro não pertencem ao "sim", nem ao "não". Não entrámos na modernidade no domingo passado. Estamos nela há duzentos anos. O tempo suficiente para percebermos que nunca teremos todos as mesmas opiniões. Tirem portanto as pêras postiças à Afonso Costa, e portem-se como gente grande. (...)

Será que estou passado da cabeça?

Não é que me vejo a concordar com Paulo Portas? Mas leiam:

[...} Salazar era honrado, escrevia um português primoroso, era invulgarmente inteligente e tinha um conceito de Pátria. Isso não faz dele um herói – o salazarismo atrasou e isolou Portugal várias décadas, ponto final. Cunhal tinha porte, resistiu à tortura, morreu fiel ao comunismo, escrevia romances (pouco interessantes) e fazia desenhos (há quem goste, eu não). Mas isso não faz dele um herói – era um estalinista empedernido e acreditava naquela patranha, ponto final. Honra seja, nenhum deles jamais desejou ganhar uma eleição. Arriscam-se a vencer postumamente a urna do ecrã.
Os franceses escolheram De Gaulle e os ingleses, Churchill. No século XX português não há nada comparável. Qualquer comparação é um logro. O século XX português foi anti-liberal, anti-capitalista, anti-democrático, anti-moderno, anti-civilizado, contra mundi e grotescamente banal. A República foi caótica, corrupta e persecutória. O Estado Novo, paroquial, subdesenvolvido e deliberadamente receoso da instrução e do mercado. O PREC, surreal, destrutivo e ignaro. Temos alguma razão para nos orgulhar? [...]


In O Sol

Ségovène Royal, a mãe indulgente da república francesa

Diz o Time:

[...] Royal finally has finally acquiesced to an image she had angrily spurned:
the Indulgent Mother of the French Republic. At the height of a critically important speech in her campaign for the presidency of France on Sunday, she took up the issue of the country's underfunded education system and allowed her cool reserve to crack. "As a mother," she said, her eyes glistening, "I want for all children born and reared in France what I've wanted for my own children."
The crowd of more than 10,000 Socialist Party members loved it. It was the key moment in her exposition of a resolutely Socialist view of the world that went down like ice cream for the party faithful. "We cannot allow financial power alone to drive the world," she insisted. "The marketplace is not the only law." As for foreign policy, her principle there was simple: "the never extinguished light of the French Revolution," shining with enlightened commitment to human rights and a multipolar world [...]

A não perder.


Outro imbróglio


O acordo dos Seis sobre a Coreia do Norte

De acordo com acordo histórico alcançado a nível dos Seis, esta semana, a Coreia do Norte vai encerrar o seu reactor do complexo de Yongbyon, o centro do seu projecto nuclear, e permitir a inspecção por funcionários internacionais.

A Coreia do Norte terá que cumprir o acordo agora assumido desactivando as suas instalações nucleares num prazo de 60 dias, recebendo como compartida 50.000 toneladas de petróleo ou ajuda económica no mesmo valor. Vai receber ainda um milhão de toneladas de petróleo ou seu equivalente quando assumir os próximos passos para desmantelar a sua capacidade nuclear, nomeadamente fornecer um inventário completo do seu plutónio, o material usado para a primeira explosão nuclear norte-coreana em Outubro.

O acordo parte de uma proposta da China que implicava o encerramento, dentro de dois meses, por parte da Coreia do Norte, das infra-estruturas de produção de armas nucleares em troca do fornecimento de ajuda energética e económica. As conversações a seis (duas Coreias, China, Estados Unidos, Japão e Rússia), organizadas pela China, começaram em 2005 com o objectivo de levar a Coreia do Norte a abandonar o seu programa de armamento nuclear. Os esforços diplomáticos não conseguiram evitar que a Coreia do Norte realizasse em Outubro de 2006 o seu primeiro teste atómico.

É dificil ainda estimar se o regime de Kim Jong Il negoceia e concerta, desta vez, de boa-fé mas o comprometimento de 5 países maiores na cena internacional neste cerco e envolvimento a Pyongyang mostra que a diplomacia pode funcionar, conjuntamente, com a força e a ameaça dela. Prova também que o multilateralismo terá assentado arraiais para o lado da Casa Branca, depois de meses de deriva unilateralista. A influência de Condoleezza Rice terá sido decisiva no concerto, o que revela o seu perfil como uma das mulheres importantes deste princípio de milénio e uma hábil diplomata na tradição kissingeriana, de que ela é, provavelmente, uma excelente discipula.

Se há já alguém derrotado por este acordo ele parece ser os neo-conservadores americanos até aqui extremamente influentes junto de George W. Bush. Fukuyama tinha razão quando num artigo luminoso no Washington Post anunciou que o neo-conservadorismo estava morto ou pelo menos em extinção. Seria bom que este pragmatismo fosse levado ao Iraque e à estratégia americana.

terça-feira, 13 de fevereiro de 2007

Gaffes e vinho de Borba

(...) Com ou sem as gaffes de Manuel Pinho, a excursão à China do eng. Sócrates tornou a provar essa realidade lúgubre. O Presidente Hu Jintao andava por África com meia dúzia de ministros. Tanto em Pequim como em Xangai, funcionários sorumbáticos deixaram os portugueses perorar e quase não abriram a boca. Sócrates, como de costume, lá andou a fazer jogging pelas ruas de Pequim, provavelmente porque nas ruas de Lisboa não pode. No intervalo declarou a "sintonia" entre governo dele e o governo da China em matéria económica e "questões mundiais", "sintonia" essa que certamente descansou muito aquela pobre região. Quanto a "negócios", consta que há a intenção de os "reforçar" e "apoiar" e que há planos para vender aos nativos software e vinho de Borba. Os chineses também gostaram muito da camisola de Ronaldo que Sócrates lhes deu. A maior gaffe da viagem foi a viagem. (...)

Vasco Pulido Valente, Público

Roger Waters - The Dark Side of the Moon [Live]

Aqui em Hong Kong, 5.aF.a, 15 de Fevereiro.

A mestria do co-fundador dos PINK FLOYD.

segunda-feira, 12 de fevereiro de 2007

Isaiah Berlin - um lapso de Pedro Correia

Diz Pedro Correia no seu "caderno diário" a coluna que mantém no Hoje Macau:

Um livro: Rousseau e outros Cinco Inimigos da Liberdade, de Isaiah Berlin.Foi uma das grandes edições “políticas” em Lisboa nos últimos dois anos, trazendo-nos um autor que durante décadas esteve injustamente esquecido do mercado editorial português, talvez por pensar contra a corrente aqui dominante. Berlin tem uma das suas principais obras agora editadas entre nós, com a chancela da Gradiva. O atraso é considerável: este livro resulta de uma série de conferências produzidas pelo autor em 1952 para a BBC em que desmontava a ideologia antiliberal de seis pensadores muito influentes dos séculos XVIIII e XIX. Rousseau, Hegel, Helvétius, Fichte, Maistre e Saint-Simon eram aparentemente cultores da liberdade. Mas foram afinal as figuras inspiradoras de alguns dos piores totalitarismos de todos os tempos, surgidos já no século XX. Berlin explica porquê, dissecando as linhas argumentativas de cada um deles com minucioso talento e uma veia polémica que o confirma como um maître penseur - um dos maiores do seu tempo. Num país onde os liberais continuam a ser olhados com suspeição, não admira que Berlin fosse visto durante demasiado tempo como um autor quase clandestino. Graças a Guilherme Valente e à sua Gradiva, caiu enfim o muro à volta dele.

Não é verdade que exista, pelo menos nos últimos 15 anos, um muro de silêncio à volta de Isaiah Berlin. Desde logo porque ele faz parte do curriculum escolar da mais importante universidade privada portuguesa, a Universidade Católica, e tem um lugar de excelência no mestrado em Ciência Politica, ministrado no Instituto de Estudos Políticos . O contributo de Isaiah Berlin para o pensamento político contemporâneo tem sido enfatizado, de uma forma consistente, por João Carlos Espada, director do mesmo instituto e actual assessor político do Presidente da República e desenvolvido pelos seus alunos [entre os quais me incluo com o Paulo Marcos]. Em segundo lugar a Gradiva e Guilherme Valente não foram originais na divulgação de Berlin. Já antes a Editorial Bizâncio havia lhe dado o devido destaque tendo publicado em 1998 A Busca do Ideal – Uma Antologia de Ensaios. Publicar Berlin em 1998 era difícil dado a hegemonização da discussão intelectual pela esquerda radical. Berlin nunca foi perdoado pelos compagnon de route dos comunistas pela sua crítica verrinosa ao totalitarismo, inclusive o comunista. Reeditá-lo hoje torna-se mais fácil dada a projecção pública de muitos analistas próximos da orientação liberal [Pacheco Pereira, Marina Costa Lobo, Pedro Magalhães, João Rosas] . A Guilherme Valente não terá falhado o sentido de oportunidade comercial.


Postais de Cabo Verde II- A globalização

A viagem a Cabo Verde permitiu-me conhecer melhor o significado da globalização quando aplicada ao sector do turismo. Então, é assim:
- Compra-se um bilhete na TAP, porque a hora do voo da TACV não é a mais conveniente e, chegado ao balcão do check-in, constata-se que afinal o voo é em codeshare ( TAP e TACV), pelo que poderia ter viajado à hora pretendida, pela TACV, poupando algumas dezenas de euros a quem me pagou a viagem. Primeira constatação: ou as agências de viagens não sabem o que andam a fazer, informando mal os clientes, ou reservam os bilhetes da TACV para os turistas que viajam nos pacotes que elas vendem. Quem viajar por sua conta e risco, que se amanhe!
As próximas surpresas surgem nos episódios seguintes. Chegado ao avião, constata-se que não pertence nem à TAP , nem à TACV, mas sim a uma transportadora checa e que a tripulação, por acaso, é eslovaca e não fala uma palavra de português. As revistas a bordo são escritas em checo e inglês, mas ( vá lá...) têm um artigo bi-lingue ( inglês e checo) interessante sobre as potencialidades turísticas do país de destino: Cabo Verde. Finalmente, na hora da refeição, conclui-se que o serviço de cattering foi fornecido por um restaurante italiano!
Conclusão: um passageiro português compra um bilhete de avião numa companhia aérea portuguesa, para um destino onde a língua oficial é o português, mas não tem direito nem a um suminho, ou a uma água portuguesa, nem a obter informações na sua língua, porque a tripulação só fala inglês e a sua língua materna ( neste caso o checo). Perguntei ( em inglês, claro!) a uma das três atraentes moçoilas, que do alto do seu metro e noventa, distribuíam os tabuleiros com o jantar,se havia algum passageiro checo. Perante a resposta negativa, saída de lábios carnudos implantados 20 centimetros acima da minha cabeça ( acima dos quais ainda se podiam ver dois cristalinos olhos azuis mirando-me como se fosse um extraterrestre, emoldurados por uma bela cabeleira loira), interroguei-me por que razão as informações de bordo tinham sido dadas em inglês e naquela língua, e não em português, mas a única resposta que obtive dos meus botões, foi um envergonhado silêncio.
A história dava pano para mangas se estivéssemos a falar de defesa do consumidor, mas como não é esse o propósito deste Postal de Cabo Verde, limito-me a perguntar-me, na vã esperança de obter uma resposta, se a minha estupefacção perante o que acabo de relatar se deve a ignorância ou a deslumbramento...
No entanto, justiça seja feita, havia um toque português em tudo aquilo: o vinho!

Postais de Cabo Verde

Motivos profissionais obrigaram-me a uma viagem a Cabo Verde na última semana. Durante a estadia, fui cativado pela extraordinária simpatia dos caboverdianos e pela forma afável como recebem os portugueses e os turistas em geral. Menos agradável, foi ter sentido na pele o frio cortante do vento que atrai, principalmente à ilha do Sal, os amantes do windsurf e kitesurf. Surpreendente e mesmo desagradável foi, porém, ter constatado a herança de laxismo que deixamos como marca de origem e que relato em dois breves episódios
1º Acto- Acabado de aterrar no aeroporto do Mindelo ( chamemos-lhe assim...) apanhei um táxi para a cidade. Assim que arrancámos, o taxista ( José) apressou-se a mostrar-me as instalações do novo aeroporto, que será inaugurado em Março, tendo o cuidado de acrescentar que já deveria ter sido inaugurado em Outubro, mas que atrasos nas obras obrigaram ao atraso de seis meses na inauguração. Sabia, por ter lido numa revista de bordo, que o recém inaugurado aeroporto da Praia também sofrera atrasos de um ano e arrisquei-me a perguntar-lhe as razões desses frequentes atrasos. Com um sorriso de orelha a orelha, o José deu-me resposta pronta: "Sabe, isto aqui em Cabo Verde é sempre sem stress. Foi herança dos portugueses!"
Ao pensar no atraso das obras do Metro que deveriam ter sido concluídas em 1998, mas só este ano estarão prontas, no túnel do Marquês ou no túnel do Rossio, quem poderá contradizer a sentença sábia do José que, vim a saber, até já foi emigrante em Portugal, onde esteve a trabalhar nas obras?
2º Acto- Entro no aeroporto do Sal, atrasado para fazer o check in. Deparo de imediato, na entrada do topo norte, com a indicação de "partidas voos internacionais", mas o meu destino é um voo doméstico. Percorro todo o corredor, mas nenhuma placa indicando a entrada. Dirijo-me ao balcão de informações e pergunto onde é a entrada para os voos domésticos.
" É no outro extremo do aeroporto"- informa-me uma uma simpática voz feminina em corpo com tons de canela. Percorrido o corredor em sentido inverso, volto a encontrar apenas a indicação da partida para voos internacionais. Pergunto ao segurança se é aquela a porta de partida para os voos domésticos e, obtida a confirmação, censuro a falta de indicação.
De novo a resposta vem na ponta da língua:
"Ter informação, tem, mas caiu no Natal e nunca mais ninguém voltou a pô-la lá.."
Espantado com a resposta, só quem não viaja pelas estradas portuguesas ou percorre as ruas deste lindo Portugal. Mas constarngido com a herança que deixámos a este povo não pude deixar de ficar...

A propósito da croniqueta de Clara Ferreira Alves ( CFA) na "Única", o comentário que me apetece fazer é que a senhora, que em tempos tanto admirei pela qualidade e sensibilidade da sua escrita, avariou desde que foi para a Casa Fernando Pessoa. Da sua pena e da sua boca (é ouvi-la no Eixo do Mal da Sic Notícias) saem, desde então, dislates inqualificáveis próprios de alguém que se alcondorou à condição de inatacável e julga poder dizer o que lhe vem à cabeça. Aliás, há poucos meses, num colóquio com vários colunistas da imprensa, tive a oportunidade de constatar o enfado e mesmo algum gozo, com que CFA se referia aos leitores que lhe enviavam críticas aos seus escritos.
De qualquer modo, vale a pena lembrar que são muitos os "opinionmakers" da nossa praça que têm a mesma visão sobre a China e os chineses. Num artigo publicado recentemente, chamei a ataenção para o facto, e aconselhei todos aqueles que falam e escrevem de "cartilha" sobre a China, a lerem o "Século Chinês" - um livro escrito por um jornalista do La Republica que vive em Pequim. Talvez aprendessem alguma coisa sobre a China actual e fossem mais recatados a emitir opiniões sobre aquilo que desconhecem. O problema é que estas posições têm grande aceitação popular...
De lamentar, é que um organismo público ( a Agência para a Segurança Alimentar e Económica) que está a fazer um trabalho notável e elogiado por todos os sectores, tenha contribuído também para acentuar esta relutância em relação à comunidade chinesa, ao fazer uma acção de inspecção abrangendo exclusivamente restaurantes chineses.

domingo, 11 de fevereiro de 2007

Faz sentido?

Lido no "Público"
Os Estados Unidos têm "em estado avançado" planos para um ataque aéreo contra instalações nucleares no Irão na Primavera, embora o mais provável seja no próximo ano, pouco antes de George W. Bush deixar a presidência, noticiou ontem o diário britânico The Guardian.
Os sinais de preparativos têm-se sucedido, dizem especialistas em segurança citados pelo jornal, referindo-se a um reforço militar no Golfo Pérsico, com o envio de mais um porta-aviões, o USS John Stennis, para apoiar o USS Eisenhower, além da instalação de baterias de mísseis antimísseis Patriot.
O vice-Presidente, Dick Cheney, e neo-conservadores ligados ao American Enterprise Institute são os principais partidários da abertura de uma nova frente de guerra no Médio Oriente, adiantou o jornal londrino. Contra estão o Departamento de Estado e o próprio Pentágono, bem como uma maioria de republicanos e democratas no Congresso.


Esta fixação em se meter no vespeiro mais próximo não augura nada de bom. A entourage de Bush persiste em não retirar as devidas conclusões do falhanço do Iraque e dos porquês. Agora quer meter-se com o Irão. Não desdramatizo a ameaça que acho eminente e muito grave. Mas marrar contra uma parede não é a melhor forma de a ultrapassar. Veja-se o discurso de Putin este fim-de-semana que apanhou americanos e o alto comando da NATO de calças na mão. Atente-se no que ele dirá no périplo pelo Médio Oriente. A Guerra Fria está morta e sepultada? Ummmm...

Islão ou Islamismo?

Um artigo importante de Meghnad Desai no Open Democracy: The roots of terror: Islam or Islamism?. Ainda sobre o tema:

- UNDERSTANDING ISLAMISM, Middle East/North Africa Report N°37 – 2 March 2005

- The ‘West’, Islam and Islamism. Is ideological Islam compatible with liberal democracy?
Caroline Cox and John Marks, aqui.

O sim ganha

O sim à despenalização da interupção voluntária da gavidez ganha com 59,25 % dos votos expressos, ficando o não com 40,75%. A abstenção foi ligeiramente abaixo de 1998 com 56,4%.
A maioria simples expressa torna o resultado do referendo não vinculativo, o que devolve a iniciativa legislativa à Assembleia da República que terá de legislar em conformidade.
Dada a maioria de votos da esquerda (PS+PCP+BE) a descriminalização da IVG não será problema.

Três comentários. Primo, o eleitorado manifestamente dividiu-se a meio com o Norte e o Centro a votarem no não e o Sul, Porto, Leiria e Castelo Branco a votarem no sim. Secundo, o elevado número de abstenções revela que o eleitorado não achou a escolha decisiva ou fracturante e por isso não se mobilizou, achando que importa aos seus representantes no parlamento fazer as devidas consensualizações e legislar. Tertio, se há vencedores neste sufrágio eles são José Sócrates pela forma inteligente e sóbria como coordenou o apoio do PS ao sim e Marques Mendes. Este último pela forma equilibrada como geriu as contradições na base de apoio e nos militantes do PSD deixando que cada um se expressasse conforme a sua consciência. A prazo consolida um peso fundamental do PSD no concerto de soluções no parlamento.

A praga CFA

Caro Arnaldo,
Ainda bem que escreveu sobre esse texto de Clara Ferreira Alves publicado no Expresso. Confesso que fiquei tão impressionado com a idiotice do artigo quando o li que, para não desatar ao insulto mais primário, mantive-me em silêncio. Esse texto - entitulado "A Praga Chinesa" reflecte o gabarito de uma certa elite "intelectual" e cosmopolita lusitana de trazer-por-casa.
É caso para dizer: a sinofobia e a ingnorância têm limites!