A Democracia segundo Alberto João
Ao longo dos seus 30 anos de mandato, Alberto João Jardim tem exprimido de várias formas o seu singular conceito de democracia. Insultuoso, roçando a ordinarice, sempre de dedo em riste apontado ao Continente, cujo Governo encara como uma entidade abstracta que lhe tolhe os caminhos do progresso, AJJ sempre conviveu mal com os políticos que lhe quiseram pôr algum freio. Já tratou Cavaco como “senhor Silva”, agora diz desconhecer José Sócrates, a quem chama Pinto de Sousa.
Para AJJ Democracia sempre foi sinónimo de confronto, mas as eleições de 2005 que conduziram o PS ao poder e as presidenciais de 2006 que elegeram Cavaco, retiraram-lhe espaço de manobra. Apesar de ter tacticamente apoiado Cavaco à presidência, sabia que não iria ter no actual Presidente da República um aliado incondicional, pronto a apoiar todas as suas diatribes. Engoliu-o como um soporífero e ficou sempre de pé atrás. Ensaiou algumas ameaças a Cavaco, mas o Presidente não lhe deu troco, por isso iniciou o ciclo da vitimização, como se rimasse com democracia. Nem Tolentino, o poeta das rimas loucas, faria rima tão estapafúrdia, mas o “senhor da Madeira”, acolitado pelo fragilizado Marques Mendes, achou que esta seria a melhor via para se impôr .
Para AJJ Democracia significa poder subvencionar um jornal com capitais públicos ( 5 milhões de euros por ano) no qual escreve, quando lhe apetece e considera conveniente, editoriais a zurzir no Governo e nas instituições que o contrariam, recorrendo amiúde ao insulto. Atitude idêntica no Continente seria por ele classificada de “totalitarismo”, mas na Madeira, desde que seja para servir os seus interesses pessoais, é “normalidade democrática”. E dentro dessa “normalidade”, irado com o facto de nem o Governo nem o Presidente da República lhe darem troco, na questão da Lei das Finanças Regionais, aproveitou a quadra carnavalesca para encenar mais um acto da sua peça: demitiu-se, para se recandidatar, numa demonstração inequívoca de desprezo pelas instituições e de totalitarismo, próprias de alguns ex-ditadores sul-americanos.
Vai-se então embora o homúnculo, ao fim de 30 anos de exercício de poder absoluto? Não! Restam poucas dúvidas que Jardim irá suceder a Jardim. Quem conhece a Madeira, sabe que uma vitória da oposição não tem condições de se concretizar. Mas Jardim, apesar de tudo, corre um risco: ter uma maioria mais escassa do que a actual. Se isso acontecer, ficará com menos espaço de manobra e deixará em maus lençóis Marques Mendes, que mal Jardim acabara de anunciar as suas intenções, correu para as televisões a manifestar o seu apoio à decisão do líder madeirense. Um poder laranja enfraquecido na Madeira daria aos rivais de Marques Mendes, dentro do PSD, novos argumentos e novas forças para o apearem e impedirem de ir às urnas em 2009. No PSD contam-se espingardas e os adversários de Marques Mendes ( com Santana Lopes e Meneses à cabeça) veriam de bom grado um desaire laranja na Pérola do Atlântico, pois isso abrir-lhes-ia as portas da liderança, sem grande contestação interna. E eis como, de repente, o folclore madeirense exibido em quadra carnavalesca, tornou mais animada a vida política portuguesa.