sexta-feira, 9 de março de 2007

Bush no quintal da América

George Bush iniciou ontem um périplo por cinco países da América Latina. O DN classifica a visita como uma “operação de charme contra Chavez”. Permito-me discordar, por duas razões . Em primeiro lugar, porque Hugo Chavez não é a única preocupação de Bush na América Latina; Evo Moralez na Bolívia e mesmo Lula, no Brasil, são outros líderes sul americanos que, juntamente com outros de menor expressão, põem problemas aos Estados Unidos. Em segundo lugar, Bush cometeu um erro na sua ronda, ao deixar de fora a Argentina. Néstor Kirchner é um moderado que ressuscitou a Argentina de um colapso económico sem precedentes, conseguindo em cinco anos voltar a colocar a pátria azul-celeste no top dos países em crescimento na região. Não morrendo de amores pelos EUA, mas longe de ser hostil, o presidente argentino terá levado a mal este “esquecimento” , por pensar que merecia receber Bush em Buenos Aires e aliou-se a Chavez na promoção das acções de contestação à agenda da visita, que começaram assim que Bush aterrou em S.Paulo É óbvio que esta aproximação tem apenas algo de circunstancial, pois Kirchner está a léguas de distância das posições de Chavez. No entanto, a realização de eleições na Argentina, em Outubro, levou-o a tomar uma iniciativa que agradasse às aguerridas organizações de esquerda de cujos votos precisa para ser reeleito. Mas a verdade, é que uma ida de Bush a Buenos Aires poderia ser mais prejudicial do que benéfica para as pretensões do presidente argentino em ser reeleito...
A visita de Bush tem, essencialmente, dois objectivos. O primeiro é económico: Bush fez uma inflexão quanto à política ambiental , deixou de manifestar hostilidade ao Protocolo de Quioto - tendo até ensaiado uma aproximação às teses consensuais-, e precisa de fazer uma aposta consistente nos bio-combustíveis. O etanol é uma das propostas mais apetecíveis e o Brasil o maior produtor deste produto. Por outro lado, o Brasil pode ser a porta ideal para implementar, na América Latina, a agenda de Doha. Só que Lula pretende contrapartidas e não é líquido que Bush esteja disposto a conceder-lhas...
O segundo objectivo é político: uma das apostas de Bush, em 2000, era uma aproximação à América Latina, que os atentados de 11 de Setembro não terão permitido concretizar. Pelo contrário, adensou-se o clima anti-Bush que se vive na maioria dos países sul americanos e que estão bem expressos no “efeito dominó” que a eleição de Chavez na Venezuela fez alastrar a outros países da região. A política americana em relação aos seus vizinhos do Sul tem sido sempre de oportunismo e arrogância. A eleição conturbada de um pró americano no México deu oportunidade a Bush de ( ali sim!...) fazer uma operação de charme que minorasse os efeitos da sua política anti-imigração. A agenda é a mesma para a Guatemala, mas quanto ao Uruguai e Colômbia, a visita de Bush tem apenas como objectivo reforçar “velhas causas” dos americanos: o combate ao tráfico de droga e a assinatura de acordos comerciais onde os americanos ficam sempre com a febra e os sul americanos a roer os ossos. Portanto, salvo qualquer surpresa de última hora, ( quase) nada de novo se espera da visita de Bush aos seus vizinhos do sul. Mas, pelo menos durante alguns dias, o presidente americano pode desviar as atenções do Extremo Oriente( onde tudo parece estar cada vez mais complicado para os americanos) para outra região do globo, apresentando-se com uma nova postura que lhe permita recuperar um pouco a imagem, junto da opinião pública interna e mundial.