terça-feira, 24 de abril de 2007

25 de Abril 3- Quando a Justiça é cinzenta...

Há cerca de duas semanas, alguns advogados inauguraram uma “Loja Jurídica” num Centro Comercial. Aberta das 10 às 23, propõe-se cobrar 35€ por consulta. Quando li a notícia, confesso que achei uma ideia boa e original. Antes de mais, porque se trata de uma iniciativa que permite a jovens advogados, em princípio de carreira, exercerem a sua profissão, mas também por que pensei, na minha ingenuidade, que era uma forma de democratizar o acesso à justiça, retirando-a dos bafientos escritórios das empresas de advogados que para muitos são umbrais intransponíveis quer pela bolsa, quer pelo temor reverencial, que inibe a maioria dos portugueses de recorrer aos serviços de um advogado.
Foi por isso com surpresa que li, este fim de semana, que a Ordem dos Advogados decidira instaurar um processo disciplinar à advogada que deu a cara pela ideia, alegando que se trata de uma modernice que “vulgariza a advocacia”. Inicialmente, fiquei estupefacto, mas depois pensei um pouco sobre o assunto e compreendi que a reacção da Ordem não poderia ser outra.
Para os senhores advogados bem instalados na vida, a advocacia não pode deixar de ser aquela actividade “cinzentona” que tem como meta inculcar nos cidadãos o temor reverencial . A administração da justiça não pode ser para todos, deve estar reservada aos que têm poder de compra para contratar uma dessas “ fábricas-empresa” que são as sociedades de advogados onde, por entre lustres e cadeirões acetinados, uns quantos “engravatados” se dedicam a “grandes causas” ( leia-se : às causas que dão dinheiro).
Compreendo os argumentos da Ordem, também, porque um advogado que esgrima os seus argumentos a partir de um Centro Comercial, pode cair na tentação de acompanhar a tendência e organizar as suas das épocas de saldos.
Agora, que pensei no assunto, é para mim claro como água que a justiça barata e das pequenas causas deve ser assegurada pelo Estado, não devendo os advogados fazer concorrência entre si. Mas o siso dá lugar ao riso quando leio um outro argumento invocado no parecer da Ordem: “o exercício da advocacia rege-se pelo princípio da dignidade da profissão, o qual rejeita estratégias e actuações de cariz desmedida ou exclusivamente comercial,ou que possam criar uma aparência de mercantilização da profissão”- pode ler-se.
Agora, os leitores que já acabaram de se rir, com esta pérola da demagogia jurídica, perguntem comigo à Ordem dos Advogados:
- Não será por acaso mercantilismo cobrar ao cliente à percentagem?
- E não será por acaso pura propaganda comercial a busca de protagonismo de alguns advogados que, perante um processo mediático, se desdobram em contactos com a comunicação social, para darem entrevistas anunciando “ o defensor dele sou eu, quando precisarem de alguma coisinha, recorram aos meus serviços”?
- Quando é que os senhores advogados vão compreender que a democratização do acesso à Justiça passa também por serem um bocadinho menos “emproados”?