Uma mulher no Eliseu?
A grande surpresa das eleições francesas foi... não ter havido surpresas. As sondagens acertaram na “mouche”, os eleitores cerraram fileiras e acorreram em massa às urnas ( uma taxa de abstenção inferior a 15% é a mais baixa de sempre), os candidatos que desde o início eram apontados como “finalistas” vão mesmo à segunda volta e Le Pen afundou-se - embora 11% de eleitores a votar num candidato fascista dê que pensar....
A elevada participação resultou na concentração dos votos nos dois candidatos ganhadores, relançando a luta eleitoral na tradicional dicotomia entre direita e esquerda.
Ainda é cedo para se apontar um vencedor, embora Sarkozy leve vantagem, pois irá recolher a quase totalidade dos votos de Le Pen , enquanto Ségolène não terá muito onde ir rapar. A extrema esquerda continua na sua lógica de preferir um candidato de direita, a votar num candidato socialista- o que até se compreende, pois assim a sua berraria tem mais alguma audiência- pelo que lhe resta esperar que a esmagadora maioria dos votantes de Bayrou se inclinem para o seu lado, mas mesmo assim não serão suficientes.
À primeira vista, Sarkozy será então o futuro inquilino do Eliseu, mas a Ségolène ainda resta uma esperança: que nas próximas duas semanas Sarkozy meta uma argolada “à Berlusconi” , revelando a sua imagem de "caceteiro" e "machão belle époque" . Se isso acontecer e Ségolène tiver finalmente um discurso mais afirmativo, que atraia alguns votos à sua esquerda, então a luta será renhida e decidir-se-á através de “photofinish”.
Como já aqui escrevi, a eleição de Sarkozy será altamente penalizadora para a Europa, cujo futuro estará intimamente ligado ao resultado destas eleições. E esse poderá ser o derradeiro “trunfo” de Ségolène, pois embora os franceses votem essencialmente a pensar no seu país, não são estúpidos ao ponto de esquecerem que uma perda de protagonismo dos tricolores na construção europeia será prejudicial para a França. Seria bom para a Europa e para o Mundo em geral, ter uma mulher no Eliseu. Para além de um pouco mais de humanismo, as mulheres trazem à política uma lufada de ar fresco. O chauvinismo francês, porém, dificilmente permitirá que a política deixe de ser aquela coisa aniquilosada, estéril e desinteressante, que os homens laboriosamente transformaram na coutada das suas idiossincrasias, das suas frustrações e dos seus vícios privados.