Postais de Buenos Aires 1-As avós da Plaza de Mayo
Pela primeira vez, em 12 anos, aterro em Ezeiza debaixo de chuva. Miudinha, mas incomodativa e descoroçoante , principalmente para quem deixou Lisboa com um tempo primaveril e esperava aterrar no verão argentino. A manhã ainda está a despontar e sigo de imediato para o hotel, como sempre localizado bem perto da Plaza de Mayo É ali que todas as quintas feiras se reúnem em vigília, frente à Casa Rosada ( sede do governo), as mães e avós de Mayo. São mulheres que envergam xailes e empunham cartazes reclamando a devolução dos cadáveres dos seus filhos e netos assassinados durante a sangrenta ditadura argentina.
Já lá vão quase três décadas que o ritual se repete semanalmente, mas aquelas mulheres recusam-se a esquecer os facínoras que delapidaram centenas de vidas, deixando os opositores ao regime morrer nos cárceres ou lançando-os de helicópteros, ainda vivos, nas águas do Atlântico. Muitos deles eram jovens que lutaram e morreram por uma causa.
Quando vejo aquelas mulheres na sua vigília semanal, lembro-me sempre das centenas de jovens portugueses que foram obrigados a morrer em África por uma causa que não era a deles. E lembro-me de muitas das suas mães e avós que, embora sofrendo com a sua morte, calaram eternamente a sua dor. Muitas delas irão votar em Salazar como “O maior português de sempre” Que Deus lhes perdoe!...