quinta-feira, 30 de agosto de 2007

Ramos Horta, a elite timorense e o poder

Ramos Horta assinalou os oito anos da consulta popular que abriu caminho para a independência de Timor-Leste com duras críticas à elite timorense de que faz parte, o que se me afigura um exercício de clarividência de um líder inteligente e prudente. Ramos Horta afirmou que os timorenses "não aprenderam nada com o passado" e "que nosso ego tem sido sempre demasiado grande". E mais "não aprendemos nada do passado e continuamos a cometer os mesmos erros que custaram muitas vidas no passado não distante. Mais de três décadas passadas, tenhamos a coragem de reconhecer os erros cometidos pela elite política da geração de 70 pois os erros cometidos em determinada época custaram muito caro ao povo". E sobre a diáspora "a diáspora timorense viu-se de repente com o poder nas mãos. Afastados 24 anos da Pátria, estávamos alienados da nova realidade timorense. Apesar de minoria, fomos nós que mais poder acumulámos, criando logo à partida forte ressentimento, acentuado quando a nova élite política foi sendo percepcionada como arrogante e alienada da nova realidade timorense. Não soubemos construir pontes entre as gerações e diferentes camadas sociais, entre Díli e as zonas pobres do Timor-Leste interior, entre a élite governativa e a sociedade civil, em particular a Igreja".

Através de artigos de opinião em Lisboa e aqui (Macau) tenho procurado chamar a atenção para os erros políticos da geração que conduziu Timor à libertação e que tem mal resistido ao deslumbre do poder. Cruzei-me nos primeiros anos após o 25 de Abril com vários deles, uns que estão hoje no poder (Ramos Horta), outros na oposição (Manuel Tillman), outros afastados da política (Abílio Araújo). Defendi publicamente aqui (Macau) em debate com Moisés Fernandes, o investigador do ICS, um associação política preferencial com a Austrália, como forma de viabilizar a sobrevivência de Timor no futuro. Caiu-me o céu e a trindade em cima, mas os factos subsequentes comprovam algo que disse na altura: no dia em que as forças internacionais do dispositivo da ONU abandonaram Timor o país cairá na guerra civil. As fracturas da guerra civil de 1975, entre a Fretilin e a UDT ainda estão vivas e atravessam as famílias ao meio. Há amargura e ódio, por debaixo da superfície. Por isso as palavras de Ramos Horta são lúcidas e avisadas. Constituem alertas tanto para dentro como para fora.